O Povo do Município de Belo Horizonte, por seus representantes,
decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º - Fica o Poder Executivo autorizado a conceder, observadas
as condições fixadas nesta lei e em regulamento específico,
descontos para pagamento de créditos em favor do Município, vencidos
até 31 de dezembro de 2013, da seguinte forma:
I - para pagamento integral e à vista:
a) desconto de 90% (noventa por cento) sobre o valor das multas
moratórias e dos juros de mora, em até 30 (trinta) dias contados da
regulamentação desta lei;
b) desconto de 85% (oitenta e cinco por cento) sobre o valor das
multas moratórias e dos juros de mora, em até 60 (sessenta) dias
contados da regulamentação desta lei;
c) desconto de 80% (oitenta por cento) sobre o valor das multas
moratórias e dos juros de mora, em até 90 (noventa) dias contados da
regulamentação desta lei;
II - para pagamento parcelado:
a) desconto de 70% (setenta por cento) sobre o valor das multas
moratórias e dos juros de mora, para pagamento em até 12 (doze)
parcelas mensais;
b) desconto de 60% (sessenta por cento) sobre o valor das multas
moratórias e dos juros de mora, para pagamento de 13 (treze) até 24
(vinte e quatro) parcelas mensais;
c) desconto de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor das multas
moratórias e dos juros de mora, para pagamento de 25 (vinte e cinco)
até 36 (trinta e seis) parcelas mensais;
d) desconto de 40% (quarenta por cento) sobre o valor das multas
moratórias e dos juros de mora, para pagamento de 37 (trinta e sete)
até 84 (oitenta e quatro) parcelas mensais.
§ 1º - As pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos,
poderão parcelar a dívida em até 120 (cento e vinte) parcelas
mensais, com redução de 90% (noventa por cento) das multas
moratórias e dos juros de mora.
§ 2º - Para efeitos desta lei, considera-se pessoa jurídica de
direito privado, sem fins lucrativos, aquela que, constituída desta
forma, não distribuir qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas
rendas, a qualquer título, aplicar integralmente, no País, os seus
recursos na manutenção de seus objetivos institucionais e manter
escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de
formalidades capazes de assegurar sua exatidão.
§ 3º - Os honorários advocatícios fixados em decisão judicial serão
calculados sobre o montante do valor do débito consolidado e poderão
ser parcelados nos mesmos termos e condições previstos neste artigo.
§ 4º - O recolhimento integral e à vista do saldo devedor objeto de
parcelamento de que trata o inciso II do caput deste artigo, após o
prazo de 90 (noventa) dias contados da expedição do regulamento
desta lei, importa os mesmos descontos previstos na alínea “c” do
inciso I do caput deste artigo, desde que o parcelamento se encontre
regular.
§ 5º - O pagamento integral e à vista ou o parcelamento de créditos
previstos neste artigo importa o reconhecimento da dívida e a
incondicional e definitiva desistência de eventual ação judicial,
reclamação ou recurso administrativo correspondente ou relacionado a
eles.
§ 6º - A adesão ao disposto neste artigo deverá ser feita em até 120
(cento e vinte) dias contados da expedição do regulamento desta lei.
Art. 2º - Os descontos previstos nesta lei:
I - aplicam-se somente aos créditos decorrentes de lei editada no
âmbito de competência do Município;
II - não se aplicam aos créditos objeto de transação;
III - não se aplicam aos créditos objeto de compensação;
IV - não se aplicam ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza -
ISSQN - retido na fonte e não recolhido nos prazos estabelecidos na
legislação municipal.
Art. 3º - VETADO
Art. 4º - O atraso no pagamento de qualquer parcela por período
superior a 90 (noventa) dias, bem como a desistência do recolhimento
das parcelas mediante débito automático em conta corrente, implicará
o cancelamento do parcelamento e a restauração do valor original dos
créditos reduzidos na forma desta lei, relativamente às parcelas não
pagas.
Art. 5º - As pessoas jurídicas de direito privado, sem fins
lucrativos, que não comprovarem os requisitos previstos no § 2º do
art. 1º desta lei, terão os parcelamentos cancelados e a restauração
do valor original dos créditos, bem como das multas e juros sobre
eles incidentes, abatendo-se os valores já pagos.
Art. 6º - Ficam remitidos:
I - os créditos referentes à Taxa de Iluminação Pública - TIP - e à
Taxa de Limpeza Pública - TLP, correspondentes a fatos geradores
anteriores ao exercício de 2000;
II - os créditos referentes ao Imposto sobre a Propriedade Predial e
Territorial Urbana - IPTU - relativos a fatos geradores anteriores
ao exercício de 2000, naquilo que ultrapassarem a aplicação da
alíquota mínima relativa à tipologia do imóvel, sujeitando-se o
saldo remanescente aos mesmos percentuais de descontos previstos no
art. 1º desta lei.
Art. 7º - Os benefícios concedidos por esta lei não geram direito à
compensação ou à restituição de quaisquer quantias pagas
anteriormente ao início de sua vigência.
Art. 8º - Ato do Poder Executivo regulamentará o disposto nesta lei.
Art. 9º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Belo Horizonte, 15 de setembro de 2014
Marcio Araujo de Lacerda
Prefeito de Belo Horizonte
(Publicada no “DOM” de 16/09/2014)
(Originária do Projeto de Lei nº 1.108/14, de autoria do Executivo)
RAZÕES DO VETO PARCIAL
Ao analisar a Proposição de Lei nº 53/14, que “Autoriza o Executivo
a conceder, por meio de programa específico e temporário, descontos
para pagamento, à vista ou parcelado, de créditos em favor do
Município, e dá outras providências”, originária do Projeto de Lei
nº 1.108/14, de autoria do Executivo, sou levado a vetá-la
parcialmente, pelas razões que passo a expor.
A Emenda Aditiva nº 2 apresentada ao Projeto de Lei nº 1.108/14 teve
o condão de acrescentar a presente Proposição seu art. 3º, cujo
cerne objetiva limitar apenas às pessoas naturais cuja dívida total
não ultrapasse o valor de R$100.000,00 (cem mil reais), assim como
às pessoas jurídicas cuja dívida total não ultrapasse o montante de
R$300.000,00 (trezentos mil reais), a concessão de descontos
incidentes sobre o valor das multas moratórias e juros de mora,
somados à possibilidade de parcelamento do débito.
Todavia, a intenção de limitar a concessão dos benefícios em razão
do valor total da dívida resulta em flagrante ofensa ao
constitucional princípio da igualdade, insculpido no caput do art.
5º da Constituição da República, por estabelecer tratamento
diferenciado entre aqueles que se encontram em situação de
equivalência quanto à concessão das benesses em comento.
Importa ressaltar que os benefícios consistentes na concessão de
descontos sobre multa e juros de mora implicam em incidências
moratórias de mesma natureza legal e jurídica, independentemente do
valor do crédito em favor do Município, razão pela qual é de todo
inquestionável que estabelecer limitação fundamentada apenas e tão
somente no montante total da dívida das pessoas naturais e jurídicas
representa vedação absolutamente contrária ao basilar princípio da
igualdade.
Nesse particular, é esclarecedora a doutrina de Canotilho ao
afirmar: “O princípio da igualdade, no sentido de igualdade na
própria lei, é um postulado de racionalidade prática: para todos os
indivíduos com as mesmas características devem prever-se, através de
lei, iguais situações ou resultados jurídicos.” (CANOTILHO, José
Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3ª
Ed. Coimbra: Almedina, p. 427). O princípio da igualdade proíbe o
arbítrio, ou seja, as diferenciações de tratamento que não sejam
baseadas em fundamento material razoável e que não apresentem
critérios de valor objetivos constitucionalmente relevantes.
Tal isonomia é amplamente defendida pelo ordenamento jurídico
pátrio, tendo inclusive respaldo no Supremo Tribunal Federal,
conforme voto da Lavra do Ministro CELSO DE MELLO:
“[...] o princípio da isonomia – cuja observância vincula todas as
manifestações do Poder Público – deve ser considerado, em sua
precípua função de obstar discriminações e de extinguir privilégios,
sob duplo aspecto: a) o da igualdade na lei e b) o da igualdade
perante a lei. A igualdade na lei – que opera numa fase de
generalidade puramente abstrata – constitui exigência destinada ao
legislador, que, no processo de formação do ato legislativo, nele
não poderá incluir fatores de discriminação responsáveis pela
ruptura da ordem isonômica. [...] A igualdade perante a lei, de
outro lado, pressupondo lei já elaborada, traduz imposição destinada
aos demais poderes estatais, que, na aplicação da norma legal, não
poderão subordiná-la a critérios que ensejem tratamento seletivo ou
discriminatório. A eventual inobservância desse postulado pelo
legislador, em qualquer das dimensões referidas, imporá, ao ato
estatal por ele elaborado e produzido, a eiva de
inconstitucionalidade” (AI 360461 AgR/MG, Relator: Min. CELSO DE
MELLO, Julgamento: 06/12/2005, Segunda Turma).
Relevante destacar que a rigidez com que a Constituição Federal
exige obediência ao fundamental princípio da igualdade ou equidade
repercute de maneira imediata no processo legislativo que visa
normatizar questões tributárias, tal qual a instituição de
benefícios como os que ora se pretende levar a efeito. Não por acaso
é que se impõe como corolário direto do referido princípio a
expressa vedação à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios de dispensar “tratamento tributário desigual entre
contribuintes que se encontrem em situação equivalente”, consoante
norma insculpida no inciso II do art. 150 da Carta Magna.
Neste sentido, segue o entendimento do Supremo Tribunal Federal,
expresso nos seguintes julgados:
“Isenção de IPTU, em razão da qualidade de servidor estadual do
agravante, postulada em desrespeito da proibição contida no art.
150, II, da CF de 1988.” (AI 157.871-AgR, Rel. Min. Octavio
Gallotti, julgamento em 15-9-1995, Primeira Turma, DJ de 9-2-1996.)
“EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 271 DA LEI
ORGÂNICA E ESTATUTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO
NORTE --- LEI COMPLEMENTAR N. 141/96. ISENÇÃO CONCEDIDA AOS MEMBROS
DO MINISTÉRIO PÚBLICO, INCLUSIVE OS INATIVOS, DO PAGAMENTO DE CUSTAS
JUDICIAIS, NOTARIAIS, CARTORÁRIAS E QUAISQUER TAXAS OU EMOLUMENTOS.
QUEBRA DA IGUALDADE DE TRATAMENTO AOS CONTRIBUINTES. AFRONTA AO
DISPOSTO NO ARTIGO 150, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. A lei
complementar estadual que isenta os membros do Ministério Público do
pagamento de custas judiciais, notariais, cartorárias e quaisquer
taxas ou emolumentos fere o disposto no art. 150, II, da
Constituição do Brasil. O texto constitucional consagra o princípio
da igualdade de tratamento aos contribuintes. Precedentes. Ação
direta julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade do
art. 271 da Lei Orgânica e Estatuto do Ministério Público do Estado
do Rio Grande do Norte – LC 141/1996.” (ADI 3.260, Rel. Min. Eros
Grau, julgamento em 29-3-2007, Plenário, DJ de 29-6-2007.) No mesmo
sentido: ADI 3.334, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em
17-3-2011, Plenário, DJE de 5-4-2011.
Corroborando com o entendimento acima esposado, Amaro, em seu livro
“Direito Tributário Brasileiro” é enfático ao reconhecer a proibição
de tratamento diferenciado aos contribuintes em situação
equivalente: “[...] o princípio da igualdade está dirigido ao
aplicador da lei, significando que este não pode diferenciar as
pessoas, para efeito de ora submetê-las, ora não, ao mandamento
legal (assim como não se lhe faculta diversificá-las, para o fim de
ora reconhecer-lhes, ora não, benefício outorgado pela lei).”
(AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 11ª Ed. São Paulo:
Saraiva, 2005, p. 135).
Destarte, tendo em vista que a medida fulcral da presente Proposição
é a concessão de descontos na multa e juros de mora, instituir
medida tendente a limitar e vedar a fruição de tais descontos
àqueles que têm dívida superior a R$100.000,00 (cem mil reais) -
pessoas naturais - e R$300.000,00 (trezentos mil reais) - pessoas
jurídicas, levando-se em consideração que tais dívidas se
sujeitaram, na origem, à incidência dos mesmos e equivalentes
acréscimos moratórios em termos percentuais, de acordo com a lei,
seria o mesmo que normatizar tratamento desigual e iníquo entre
contribuintes que se encontram em situação em tudo e por tudo
equivalente, o que se mostra inadmissível, e razão pela qual deve
ser rejeitado.
Com isso, é induvidoso que o conteúdo inserido pelo art. 3º da
Proposição de Lei nº 53/14 não tem respaldo constitucional, não
podendo ser mantido sob pena de violação dos princípios da igualdade
e da vedação do tratamento desigual entre contribuintes em estado de
equivalência, fundamentos estes orientadores do sistema jurídico
brasileiro.
Essas, Senhor Presidente, as razões que me levam a vetar o art. 3º
da Proposição de Lei nº 53/14, as quais submeto à elevada apreciação
dos Senhores Membros da Câmara Municipal.
Belo Horizonte, 15 de setembro de 2014
Marcio Araujo de Lacerda
Prefeito de Belo Horizonte
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